COMO FORAM CONSTRUÍDAS

 

(Hipótese Clássica)

 

Na realidade não existem registros escritos que expliquem como as pirâmides foram construídas e, portanto, tudo o que se diga a respeito não passa de especulação, ainda que baseada em indícios. Na visão de Heródoto, turmas de 100 mil trabalhadores, revezando-se em turnos que duravam três meses, levaram 20 anos para construir a Grande Pirâmide. Atualmente os egiptologistas acreditam que aquele monumento foi edificado por um número menor de trabalhadores e em menos tempo. A idéia de que as pirâmides foram construídas por escravos para um faraó tirânico está hoje descartada. É improvável que os egípcios tivessem escravos naquela época, pois sua sociedade era basicamente composta por camponeses. Impossibilitados de trabalhar nos campos durante três meses do ano por causa da inundação, esses homens estavam condenados à ociosidade nesse período. O empenho que demonstravam na construção das pirâmides pode ser explicado pelo fato de que acreditavam que o faraó era um deus e ajudar a construir o seu túmulo era, antes de tudo, uma honra.

Além dos camponeses que executavam um trabalho puramente braçal, havia muito mais pessoas com habilidades específicas envolvidas no empreendimento. A enorme demanda de pedras exigia especialista na tarefa de extraí-las, os quais trabalhavam em turmas. Eles pintavam nas pedras, com ocre vermelho, o nome de suas turmas. Turma da Pirâmide de Degraus, Turma Vigorosa, Turma do Norte, Turma do Sul e Turma do Cetro, por exemplo, são alguns dos nomes encontrados nas pedras de revestimento da pirâmide de Meidum. Na Grande Pirâmide pode-se ler em um dos blocos: Turma dos Artesãos. Quão poderosa é a Coroa Branca de Khnum Khufu!. Também era necessário que as pedras fossem transformadas em blocos e recebessem acabamento de outros tantos mestres e, finalmente, homens hábeis na arte da costrução acentavam os blocos com precisão. Embora a maioria da força-tarefa envolvida com o deslocamento das pedras só entrasse em ação quando não havia o que fazer nos campos, os demais operários estavam permanentemente dedicados ao seu trabalho, seja nas pedreiras, seja no monumento em si. A oeste da pirâmide de Kéfren foram desenterrados alojamentos para 4000 homens, cifra que talvez represente o número total de operários permanentes, e as ferramentas lá encontradas sugerem que se destinavam a abrigar os trabalhadores das pirâmides.

Uma grande quantidade de estudo e planejamento — afirma o egiptólogo James Putnam — deve ter sido necessária antes de que qualquer construção tomasse forma. Esboços encontrados de outros monumentos sugerem que eles tevem ter feito plantas e existem modelos em pedra calcária de diversas pirâmides, os quais podem ter sido auxiliares do projeto arquitetônico. Algum conhecimento de matemática, geometria e astronomia também era requerido para calcular os ângulos da pirâmide.

Convém lembrar que um pequeníssimo erro no ângulo de inclinação de uma pirâmide resultaria num desalinhamento considerável das arestas do vértice (figura à esquerda). Outro ponto que chama a atenção é que algumas das medidas desses monumentos revelam um uso exato de Pi. A altura da pirâmide de Kéops, por exemplo, é igual ao perímetro da sua base dividida por 2 Pi. Uma vez que o conhecimento matemático dos antigos egípcios não era suficiente para que eles chegassem a resultados como esse por meio de cáculo, os estudiosos acreditam que tal precisão foi alcançada empíricamente através, por exemplo, da medição de distâncias usando-se a contagem das rotações de um objeto cilíndrico como um tambor (figura à direita).

Na escolha do local para construção das pirâmides, os egípcios levavam em conta alguns fatores principais: ele deveria estar situado na margem oeste do Nilo — o lado onde o Sol se põe —; deveria ficar bem acima do nível do rio, mas não muito longe de sua margem; o substrato rochoso deveria ser isento de defeitos ou de tendência para rachadura e, finalmente, situar-se a pouca distância da capital. Saqqara e Abusir, por exemplo, localizavam-se junto a Mênfis; Abu Rawash cerca de 27 quilômetros de distância ao norte e Dahshur a apenas oito quilômetros ao sul; Meidum ficava a 53 quilômetros de Mênfis, mas ali apenas uma pirâmide foi erguida. A proximidade do rio era um fator importante, pois muitas das pedras utilizadas na construção de todos os monumentos que compunham o complexo piramidal eram trazidas das pedreiras por via fluvial.

Encontrado o local, removia-se a grossa camada superficial de areia e cascalho, para que o monumento assentasse sobre um firme alicerce rochoso. Começava então o nivelamento e alisamento da rocha. A precisão com que se realizava tal trabalho é demonstrada pela Grande Pirâmide, na qual o perímetro da base tem um pequeno desvio de pouco mais de meia polegada com relação ao que seria um nivelamento absoluto. O emprego de canais na irrigação dos campos, desde muito antes da era das pirâmides, ensinou a gerações de egípcios as técnicas de nivelamento. Para nivelar uma área como a base de uma pirâmide — esclarece o egiptólogo I.E.S.Edwards — deve ter sido necessário rodeá-la pelos quatro lados com montículos baixos de lodo do Nilo, preencher o fosso assim formado com água e cortar uma rede de regos na rocha, de tal maneira que o piso de cada sulco ficasse a uma mesma profundidade com relação à superfície da água; os espaços intermediários podiam, então, ser nivelados após a água ter sido liberada. Em outras palavras: enchia-se de água uma rede de sulcos escavados na rocha em toda a extensão das fundações e marcava-se na pedra as linhas da superfície da água (1); secavam-se os sulcos (2); talhavam-se as pedras que excedessem o nível marcado (3) e enchia-se os espaços vazios com pedras (4). Na prática efetiva — esclarece ainda I.E.S.Edwards — a área total coberta pela pirâmide não era sempre reduzida ao mesmo nível do perímetro; como mostra a Grande Pirâmide, um monte de rocha podia ser deixado no centro para ser usado em estágio posterior do trabalho de construção.

A última das preliminares consistia em fazer uma acurada medição para que a base da pirâmide formasse um quadrado perfeito e cada um de seus lados estivesse orientado para um dos quatro pontos cardeais. A unidade de medida era o cúbito real, equivalente a cerca de 52 centímetros. Cordas de medição — prossegue I.E.S.Edwards — eram feitas com fibras de palmeira ou de linho, sendo que ambas certamente se esticavam quando usadas; portanto, é altamente surpreendente que possa haver uma diferença de apenas 20 centímetros entre os comprimentos dos lados maior e menor da Grande Pirâmide — na realidade, parece notável que em lados que excedem 22860 centímetros de extensão possa ter ocorrido um erro tão pequeno, especialmente quando nos lembramos de que o monte central de rocha teria tornado impraticável qualquer medição da diagonal para verificar a precisão do quadrado. A orientação exata das pirâmides com relação aos pontos cardeais só pode ter sido obtida com a ajuda de um ou mais dos corpos celestes, uma vez que a bússola era desconhecida dos antigos egípcios. Não foi possível determinar com exatidão quantos ou quais dos corpos celestes eram empregados nesse processo, mas é lógico que bastava estabelecer a orientação de um dos lados, já que a dos demais se fixava naturalmente com o uso de um esquadro. Outras construções da mesma época, cujos cantos formam ângulos retos perfeitos, demonstram que esse último instrumental existia.

Ao mesmo tempo em que os trabalhos preparatórios ocorriam no local do monumento, os alicerces da calçada iam sendo assentados. E isso era feito nessa fase porque quase todas as pedreiras que forneciam material localizavam-se próximas das margens do Nilo, da mesma forma que as pirâmides. Assim sendo, o rio podia ser empregado para o transporte das pedras por meio de balsas. Já que cada pirâmide dispunha de uma calçada que a ligava ao Nilo, a qual se destinava à passagem do cortejo fúnebre, esse era também um caminho conveniente para que nele se arrastasse uma espécie de trenó contendo os enormes blocos de pedra e, portanto, a base da calçada deveria estar concluída antes da edificação da pirâmide.

Existem duas vantagens principais no emprego de enormes blocos de pedra na construção de monumentos grandiosos como eram as pirâmides e templos egípcios: obtenção de maior estabilidade e redução no número de junções a serem feitas. O arqueólogo I.E.S.Edwards escreveu: Kéops, que deve ter sido um megalomaníaco, jamais poderia, durante um reinado de cerca de 23 anos, ter erigido um monumento do tamanho e durabilidade da Grande Pirâmide se avanços técnicos não tivessem permitido a seus trabalhadores lidar com pedras de tão considerável peso e dimensões. Quão completamente eles dominaram essa arte pode ser medido pela observação de Petrie de que as junções no revestimento da Grande Pirâmide medem apenas um quinquagésimo de polegada de espessura.

Além de saberem manusear pedras tão imensas, os egípcios também conheciam a arte de talhá-las, apesar de toda a sua dureza. Já na I dinastia (c. de 2920 a 2770 a.C.) empregavam granito para pavimentar aposentos e a pirâmide de degraus de Djoser, da III dinastia, tem uma pequena câmara funerária construída totalmente desse material. Entretanto, foi no decorrer da IV dinastia que grandes estruturas, como o templo do vale e o templo mortuário de Kéfren, foram revestidas principal ou completamente com granito. O basalto é outro material que aparece esporadicamente antes da IV dinastia, quando seu emprego passa a ser bem mais considerável.

A atividade de exploração das pedreiras era intensa, tendo em vista a enorme quantidade de material necessário para erguer monumentos tão grandes. Entretanto, os antigos egípcios dispunham de pouca coisa além de serras e cinzéis de cobre primitivos para realizar o trabalho. Ainda que primitivas, as ferramentas encontradas por arqueólogos, e datadas de tempos tão antigos quanto a I dinastia, mostraram-se capazes de cortar qualquer tipo de pedra calcária. Seja como for, eles devem ter desenvolvido técnicas especiais para extração dos blocos. A pedra calcária de qualidade inferior e mais maleável podia ser manuseada facilmente a céu aberto, pois encontra-se na superfície. Por outro lado, na obtenção do granito e do calcário de excelente qualidade de Tura era necessário construir túneis. Provavelmente a aplicação de calor e água facilitava o trabalho. Cunhas de madeira — informa o egiptólogo James Putnam — eram enfiadas em fendas na pedra e então ensopadas de água, fazendo com que se expandissem e rachassem a pedra. Os blocos eram então esquadrejados com o emprego de cinzéis e malhos. Serras de cobre também eram usadas, talvez com lascas de pedras preciosas para ajudar no talhe. Para trabalhar o granito tinham que golpeá-lo com esferas de uma pedra ainda mais dura chamada dolerito. No detalhe de uma pedreira que se vê acima, pode-se notar nitidamente as fendas espacejadas regularmente nas rochas. Tais fendas delimitavam os blocos que seriam extraídos com o emprego das cunhas de madeira.

A maioria dos blocos que formavam a parte interna das pirâmides tinha pouco acabamento, mas as pedras do revestimento eram talhadas com grande precisão e ajustam-se tão perfeitamente umas às outras que as junções são quase invisíveis. Todo o polimento deve ter sido dado depois que as pedras foram colocadas em seus lugares definitivos. Nas proximidades da pirâmide de Kéops foram encontrados enormes depósitos de lascas de pedra calcária provenientes do trabalho executado com os blocos. Estimou-se que a pedra acumulada em tais depósitos equivale em volume a mais da metade do volume das pirâmides.

Um dos maiores desafios era, sem dúvida, o transporte dos enormes blocos. As pedras do revestimento da Grande Pirâmide pesam, em média, duas toneladas e meia cada uma, mas isso é pouco. Algumas delas chegam a pesar 15 toneladas, mas isso também é pouco. As lajes de granito do teto da câmara mortuária da mesma pirâmide pesam 50 toneladas e, se você ainda acha que é pouco, saiba que algumas das pedras mais pesadas encontradas no templo mortuário de Miquerinos pesam cerca de 200 toneladas! E não podemos esquecer que mesmo as "menores" dessa lista tinham que ser embarcadas e desembarcadas de balsas e elevadas a alturas consideráveis com relação ao solo. Navegar com esses megálitos exigia um perfeito controle de enormes e pessadíssimas balsas lotadas, em um rio de correnteza rápida e com bancos de areia em alguns trechos, sem dúvida uma operação arriscada que requeria grande habilidade. No transporte por terra provavelmente usavam o mesmo método, qualquer que fosse o tamanho da pedra: o arraste. Apenas a quantidade de homens variava conforme o peso a deslocar.

 

COMO FORAM CONSTRUÍDAS - PARTE 2

 

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