OUTRAS PIRÂMIDES
(Parte 1)
(A Pirâmide Vermelha)
Ao que tudo indica, o faraó Snefru não ficou satisfeito com a pirâmide torta que mandara construir em Dahshur e mandou erigir outra cerca de dois quilômetros ao norte dela. Hoje esse monumento é conhecido como pirâmide vermelha ou pirâmide cor-de-rosa em função da cor do calcário avermelhado usado na sua construção. O ângulo de inclinação das faces dessa pirâmide é menor que o habitual de 52°, sendo de apenas 43° 36', ângulo muito parecido ao que foi usado na parte superior da pirâmide torta e que lhe dá um aspecto achatado. As alturas dos blocos de pedra que a constituem variam de cinquenta centímetros a um metro e 40 centímetros. Sua base quadrada mede 220 metros de lado, dimensão ultrapassada apenas pela da pirâmide de Kéops em Gizé, e sua altura original era de 104 metros.
A entrada dessa pirâmide localiza-se em sua face norte, muito acima do solo, abrindo para um corredor descendente (1) que, ao atingir a parte inferior e central do monumento, dá acesso a três câmaras (2) (3) (4), posicionadas uma após a outra. As duas primeiras são praticamente iguais em forma e tamanho e medem cerca de nove metros e 44 centímetros de comprimento por três metros e 65 centímetros de largura, estando assentadas sobre o substrato rochoso da região. A segunda câmara situa-se diretamente abaixo da ápice da pirâmide. A terceira, que provavelmente destinava-se a ser a câmara mortuária, é diferente. Situa-se em posição mais elevada que as demais e sua entrada é uma pequena passagem localizada na parede sul da segunda câmara a uma altura de cerca de sete metros e 60 centímetros acima do nível do solo. É a maior delas, medindo nove metros e 44 centímetros por quatro metros e 11 centímetros e tendo um teto afunilado que atinge a altura de 15 metros e 24 centímetros. Em seu piso foi escavado uma espécie de poço que atinge a profundidade de quatro metros e 26 centímetros.
Os arqueólogos acreditam que essa pirâmide pertenceu a Snefru, entre outros indícios, porque seu nome foi encontrado escrito com ocre vermelho em um bloco de pedra do revestimento de um dos cantos do monumento. Outro indício é o fato de que ao redor da pirâmide foram encontradas mastabas de cortesãos daquele faraó, que provavelmente ali não teriam sido erguidas se o titular da pirâmide fosse outro rei.
(A Pirâmide de Radjedef)
O não muito conhecido faraó Radjedef, filho de Kéops, que provavelmente reinou de 2528 a 2520 a.C., entre os reinados do seu pai e o de Kéfren, escolheu para erguer o seu monumento o imponente planalto de Abu Rawash, localizado cerca de oito quilômetros ao norte do planalto de Gizé. Nomeou-a de A Pirâmide que É a Estrela Sehedu, mas como quase nada restou de sua estrutura, não foi possível estabelecer suas dimensões originais e nem mesmo se ela foi concluída. Pelos escombros encontrados deduziu-se que teria sido revestida de granito vermelho, pelo menos parcialmente. Por baixo da construção há um fosso aberto que desce até a base de um poço vertical. Esse mede cerca de nove metros de profundidade, 21 metros e 33 centímetros de comprimento e nove metros de largura.
A calçada, talvez a mais refinada jamais construída, tinha cerca de 1500 metros de comprimento, atingia 12 metros de altura em alguns trechos e ligava, como sempre, o templo do vale ao templo funerário. Do primeiro nada restou. Quanto ao segundo, situa-se a leste da pirâmide e tem paredes de tijolos de lama, o que provavelmente significa que foi construído após a morte do rei. Ao sul dele existe uma cova profunda, cuja forma indica ter sido utilizada para abrigar um barco cerimonial, embora esse não tenha sido encontrado. O que se encontrou no complexo piramidal foram alguns fragmentos de estátuas de duro quartzito vermelho, entre os quais se inclui uma cabeça do faraó e uma representação dele sentado, tendo uma pequena figura de sua esposa, Kehentetka, ajoelhada e segurando-lhe a perna.
(A Pirâmide Inacabada de Zawyet el-Aryan)
A pirâmide inacabada de Zawyet el-Aryan parece ter sido erguida por um faraó da IV dinastia. A única parte que atualmente dela permanece são os seus subterrâneos, formados por um fosso aberto em declive que atinge um poço vertical cavado na rocha (1). A declividade do fosso é interrompida por dois patamares, um aproximadamente no meio de seu curso e o outro em sua parte final. Cavados na rocha entre os dois patamares existem dois lances paralelos de escada (2), separados e ladeados por largas rampas. Na parte final do fosso foi escavada uma cova (3) preenchida parcialmente com blocos de pedra calcária que se erguem um pouco além do nível da seção precedente. O poço vertical tem 26 metros de profundidade, mede 25 metros de comprimento por 11 metros e 58 centímetros de largura e seu piso também foi elevado e pavimentado com granito vermelho em sua parte central. Um sarcófago de granito oval, único em sua forma encontrado até hoje, estava embutido no solo, mas dali foi retirado pelos arqueólogos.
(A Pirâmide de Userkaf)
O fundador da V dinastia, Userkaf, que reinou aproximadamente entre 2465 e 2458 a.C., construiu sua pirâmide em Saqqara. Ergueu-a, com altura de 49 metros, junto ao canto nordeste do muro que circundava a pirâmide de degraus. Naquela época, ao que parece, o túmulo de Djoser havia adquirido uma certa aura de santidade e julgava-se que ser enterrado junto a ele poderia conferir benefícios especiais ao morto. Os egípcios chamavam-na de A Pirâmide que É Pura de Lugares ou, em outra tradução, Puros São os Lugares de Userkaf. Um santuário (1) foi erguido junto à face leste do monumento. Era formado por um pequeno vestíbulo pavimentado de basalto, ladeado por duas câmaras estreitas com piso de pedra calcária. As paredes do vestíbulo também eram de pedra calcária e assentavam-se sobre uma base quadrangular de granito. Duas plataformas existentes no recinto podem ter sido destinadas a receber colunas retangulares ou estelas de granito. Fragmentos de quartzito encontrados nos escombros indicaram a provável existência de um altar.
Como o terreno a leste da pirâmide eleva-se de forma abrupta, era impraticável construir o templo funerário naquele local e, por isso, ele foi edificado no lado sul do monumento. A entrada se dava por uma calçada (2) que desembocava próximo do canto sul do muro situado a leste da pirâmide. À esquerda da entrada, havia cinco armazéns (3) nos quais ficavam guardados os jarros com vinho e reservas de mantimentos dos quais o morto lançaria mão caso os sacerdotes negligenciassem sua tarefa diária de ofertar alimentos frescos ao falecido. Havia também duas câmaras oblongas (4) situadas entre a entrada e um pátio aberto (5). Em três lados desse pátio havia arcadas com colunas retangulares de granito cuja função era a de proteger cenas esculpidas nas paredes do recinto. Fragmentos de tais relevos foram encontrados e mostravam o faraó caçando pássaros nos pântanos do Delta. No centro da parede sul, a qual provavelmente não era decorada, havia uma colossal estátua (6) de granito vermelho representando o rei sentado, encarando a pirâmide e aparentando admirar-se de sua grandiosidade. Apenas a cabeça dessa estátua foi encontrada pelos arqueólogos e mede cerca de 76 centímetros de altura. Ao sul do pátio havia uma pequena sala hipostila (7) e os usuais cinco nichos (8) destinados a receber estátuas do faraó, as quais deveriam também estar voltadas para a pirâmide. Uma pirâmide subsidiária (9) foi construída no canto sudoeste do conjunto.
(A Pirâmide de Sahure)
Sahure, que reinou entre 2458 e 2446 a.C. aproximadamente, segundo faraó da V dinastia, escolheu um planalto na orla do deserto para edificar sua pirâmide. Atualmente o local fica próximo da moderna cidade de Abusir. Impressionante por sua magnificência artística, estima-se que cerca de 10 mil metros quadrados de paredes de pedra calcária estavam cobertos de relevos neste conjunto arquitetônico. Os egípcios chamavam-na de A Pirâmide onde o Espírito Ba se Levanta; ou, segundo outros autores, O Ba de Sahure resplandece. O lado da base da pirâmide, quando intacta, media cerca de 78 metros e 33 centímetros e sua altura era de, aproximadamente, 49 metros e 37 centímetros. O revestimento era de pedra calcária e pouco restou dele, mas uma parte considerável da estrutura do monumento permanece intacta. A entrada localiza-se na face norte da pirâmide, um pouco a leste do centro e no nível do pátio circundante. Dai parte um corredor descendente (1) por cerca de quatro metros e 27 centímetros, que a seguir torna-se horizontal por mais oito metros e 23 centímetros. Nesse ponto ele é bloqueado por uma porta levadiça de granito (2) e a seguir sobe suavemente até desembocar numa câmara funerária oblonga (3). Quase toda a extensão do corredor está revestida de pedra calcária, com exceção de pequenos trechos sem revestimento e de um trecho, não muito longo, em sua parte final, que é revestido de granito. A câmara funerária foi construída totalmente em calcário. Seu teto em ponta é formado por três camadas de alvenaria superpostas. Os maiores blocos do teto medem cerca de 10 metros e 67 centímetros de comprimento por dois metros e 74 centímetros de largura e três metros e 65 centímetros de espessura.
O templo do vale era dotado de dois embarcadouros, um virado para o leste (1) e outro para o sul (2), conectados através de rampas, ora com um canal, ora com o próprio Nilo, dependendo do menor ou maior volume de água do rio. Na face leste da construção existe um pórtico (3) com piso de basalto negro polido e teto de calcário. Esse último é sustentado por oito colunas monolíticas de granito e, para imitar o céu, está pintado de azul e decorado com estrelas douradas esculpidas em relevo. As colunas imitam a palma da tamareira, com suas folhas atadas em um feixe vertical formando os capitéis, e todas elas trazem, dentro de uma moldura retangular, o nome e os títulos do faraó em hieróglifos escavados e preenchidos com massa de cor verde. As paredes do recinto são de pedra calcária, decoradas com relevos pintados e assentam-se sobre uma base quadrangular de granito. Um pórtico similar (4), mas de dimensões menores, abre-se na face sul da construção. Tem piso de calcário e colunas cilindricas sem qualquer decoração nos capitéis. Ambos os pórticos ligam-se por passagens a um pequeno vestíbulo em forma de tê (5) e esse se comunica com a calçada (6) que liga os dois templos.
O templo funerário é formado por cinco elementos principais: um vestíbulo de entrada, um pátio aberto, cinco nichos para estátuas, armazéns e um santuário. O vestíbulo (7) tinha o piso em pedra calcária e suas paredes acentavam-se sobre uma base quadrangular de granito. Entretanto, está por demais danificado para que se possa conhecer outros detalhes. O pátio (8) era pavimentado com basalto polido e só havia nele um altar de alabastro no canto noroeste. As arcadas que o rodeavam tinham o teto decorado com estrelas e sustentado por uma fileira de colunas em forma de palmeira. As paredes estavam decoradas com relevos mostrando o faraó triunfando sobre os seus inimigos, fossem eles asiáticos, representados na parede norte, ou líbios, retratados na parede sul. Um desses relevos, — descreve I.E.S. Edwards — encontrado no canto sudoeste, mostra Sahure no ato de imolar um comandante líbio capturado; dois dos filhos do oficial líbio e uma mulher, que pode ser tanto sua esposa quanto sua filha, assistem implorando. Outros cativos líbios, alguns dos quais são mulheres e crianças, também estão representados em atitude semelhante. Em outro trecho da cena são mostrados animais vivos, tomados como butim; seu inventário é dado nas inscrições que acompanham a cena como 123.440 cabeças de gado, 223.400 asnos, 232.413 veados, cervos e corças e 243.688 ovelhas, mas apenas uma pequena fração deste vasto total está realmente representada.
Um corredor largo, pavimentado com basalto e também decorado com relevos rodeia o exterior do pátio. Aqui os relevos seguem temática diferente. No lado setentrional — continua descrevendo o mesmo autor — há cenas do rei arpoando peixes e caçando pássaros com lanças de madeira. No lado meridional, em um relevo que mede cerca de nove metros de comprimento, o rei é mostrado caçando. Atrás dele encontra-se seu sucessor Neferirkare e um grupo de cortesãos. Em frente estão antílopes, gazelas, veados, cervos, corças e outros animais com chifres impelidos por batedores para um grande cercado onde o rei os abate com flechas do seu arco. Câes de caça agarram alguns dos animais feridos pela garganta e os matam. Aqui e ali o escultor variou a regularidade da cena com toques vivos, tais como uma cobra ou um ouriço-cacheiro prontos a desaparecer em suas covas e uma hiena agarando um antílope ferido como sua presa particular.
Alguns dos mais interessantes relevos de todo o templo estavam esculpidos na parede leste do corredor oeste. Ao norte da porta de saída do pátio aberto, o rei, acampanhado de seus cortesãos, está representado testemunhando a partida de doze navios marítmos para uma terra que não está especificada, mas que era provavelmente a Palestina ou a Síria. Na posição correspondente do lado sul da porta, o rei e sua comitiva olham o retorno dos navios repletos de carga e transportando numerosos asiáticos. Nada em sua aparência sugere que os asiáticos sejam prisioneiros; os navios podem, portanto, ter sido empregados em missão comercial ou, talvez, diplomática. Já no reinado de Snefru os egípcios haviam procurado madeira na Síria e dessa maneira, se a carga era composta de mercadorias, essa expedição não representa um empreendimento novo iniciado por Sahure.
O corredor oeste, onde tais relevos se encontravam, era um ponto chave de todo o conjunto, pois ele permitia atingir, direta ou indiretamente, todas as partes do complexo piramidal. Uma porta em seu extremo norte dava acesso ou ao espaço murado que rodeava a pirâmide, ou a uma escada (9) que levava ao telhado do templo. Outra porta no extremo sul do corredor levava também à área em volta da pirâmide e ainda ao pátio de uma pirâmide subsidiária (10) e a uma entrada lateral do conjunto (11). No meio do corredor, frente à porta de saída do pátio aberto, uma passagem seguida de pequeno lance de escadas dava para uma pequena câmara (12) contendo cinco nichos para estátuas. Na parede sul dessa câmara uma porta era o único meio para atingir o santuário (13) e cinco recintos existentes ao lado dele (14), dos quais pelo menos dois eram usados para realização de algum tipo de cerimônia no ritual do templo. O santuário media cerca de 13 metros e 70 centímetros de comprimento por quatro metros e 57 centímetros de largura e apresentava em sua parede oeste uma falsa-porta de granito, ao pé da qual ficava um altar baixo de alabastro. As demais paredes, erguidas sobre uma base quadrangular de granito, eram de pedra calcária e decoradas com relevos de deuses trazendo dádivas de provisões para o faraó.
Ainda no corredor oeste, além da entrada para os nichos das estátuas, existiam dois pequenos recintos cujos tetos eram suportados por colunas graníticas de três metros e 65 centímetros de altura. Elas imitavam o formato de um conjunto de seis hastes de papiro amarradas, sendo que o capitel era formado pelos seus brotos. Através de passagens existentes em tais recintos, chegava-se aos armazéns (15), dispostos em duas fileiras, 17 à esquerda e 10 à direita. Os armazéns eram construídos em blocos de dois andares, cada um deles formado por um cômodo, sendo que cada bloco tinha a sua própria escada. Ao que parece, o grupo menor de armazéns destinava-se a abrigar objetos particularmente valiosos, tais como vasos decorados e estátuas douradas, utilizados apenas em ocasiões especiais pelos sacerdotes funerários, enquanto que o grupo maior de armazéns deveria conter vasos de pedra e provisões.
Um detalhe que chamou a atenção dos arqueólogos no complexo piramidal de Sahure foi o seu elaborado sistema de drenagem. A chuva que caia sobre o telhado vertia através de bicas de pedra com formato de cabeça de leão que se projetavam da parte superior das paredes externas. Esse tipo de gárgula — conjetura I.E.S.Edwards — pode ter sido escolhida porque a chuva era às vezes encarada como uma manifestação de Seth e de outros deuses hostis, a qual era assim consumida e expelida, após ter sido tornada inofensiva, pelo leão, o protetor dos locais sagrados. Nas partes descobertas do complexo, a água da chuva escoava através de aberturas existentes na base das paredes externas, para onde era conduzida por canaletas cavadas no piso. Havia também necessidade de drenar água e outros líquidos utilizados durante as cerimônias religiosas, sendo perigoso tocá-los pois, em alguns casos, teriam se tornado ritualmente impuros. Com essa finalidade era empregado um outro método. Cinco bacias de pedra, revestidas de cobre, estavam espalhadas em lugares estratégicos: duas nos recintos ao lado do santuário, uma no próprio santuário, outra no corredor que leva ao santuário e, finalmente, outra no grupo menor de armazéns. Canos feitos de cobre ligavam tais bacias com o sistema subterrâneo de drenagem, formado por uma linha de canos de cobre que corria por sob o piso desde o santuário até a extremidade da calçada que ficava junto ao templo do vale, onde terminava numa saída no lado sul. Todo o metal empregado nesse encanamento, com mais de 304 metros de comprimento, deve ter sido trazido do Sinai ou do deserto ocidental.