o que tudo indica, as jovens podiam casar-se a partir da idade de doze ou quatorze anos e os rapazes por volta dos dezesseis ou dezessete, mas isso muito dependia da situação financeira do casal. Os rapazes eram incentivados a cassarem-se cedo, para terem filhos. Um sábio diz em um dos textos sobre o assunto:  Estabelece um lar e ama tua mulher em tua casa assim que possas. Toma uma mulher enquanto ainda és jovem, a fim de que ela possa te dar filhos, pois um homem é considerado na medida do número de seus filhos.

lém do consentimento que davam ao matrimônio, os pais pareciam pouco interferir na escolha dos filhos, com a qual geralmente concordavam e aprovavam. É certo que havia casos em que os pais ou superiores decidiam casamentos, mas em geral os jovens eram livres para seguir o que seus corações mandassem. Sentyotes, por exemplo, uma grande princesa, casou-se com o anão Seneb e conseguiu dar-lhe um filho e uma filha normais. Dos conselhos não escapavam, porém, os rapazes nas vésperas do enlace. Os pais, baseados em antigas máximas que haviam sido escritas no decorrer da V dinastia, repetiam:

e és sábio, guarda tua casa, ama tua mulher sem confusão, alimenta-a como convém, veste-a bem. Afaga-a e satisfaze seus desejos. Não sejas bruto; obterás mais dela com atenções que com violência. Se a repeles, teu lar irá por água abaixo. Abre-lhe os braços, chama-a; dá-lhe provas de teu amor.

uanto à moça, – esclarece a escritora Christiane Noblecourt – recebia também as matronas encarregadas de dar-lhe conselhos úteis e de prepará-la para seu futuro estado de mulher. Evocava-se, então, a grande Ísis, protótipo absoluto da esposa e daquela que dá à luz, e cujo amor, fidelidade e solicitude nunca falharam. Invocava-se também a bênção de Hátor, pois ela dá às mulheres filhos e filhas, sem que as toquem doenças ou necessidade. A jovem não devia nunca deixar de dizer as preces para os mortos, pois Hátor, Dama do Ocidente, protege as mulheres da esterilidade e impede os maridos de se tornarem impotentes.

m lar harmonioso, muitos filhos, uma mulher amante, tal era realmente o desejo que a maioria dos egípcios formulava. Geralmente, para eles o amor conjugal representava um ideal a atingir e eram ajudados nisso pela aplicação de uma moral que lhes fora inculcada desde a instrução primária e que, no Egito, desempenhava um papel mais importante do que em qualquer outra civilização da Antiguidade.

inda que os faraós pudessem desposar suas irmãs e até mesmo as próprias filhas por razões dinásticas, o povo em geral não adotava a mesma prática incestuosa. Amantes e esposos chamavam uns aos outros de meu irmão e minha irmã, mas isso era apenas uma forma carinhosa de tratamento. O casamento de tios e sobrinhas, entretanto, parece ter sido permitido.

s documentos não indicam que houvesse antes do casamento um período correspondente ao nosso atual noivado. O que parece ter sido exigido é a virgindade para a jovem nubente, fato ao qual era dada uma grande importância. O romantismo, por outro lado, sempre existiu. Um jovem escreve com relação à sua amada:

egra é a sua cabeleira, mais negra do que o escuro da noite, mais negra do que a baga do abrunheiro-silvestre. Vermelhos os seus lábios, mais vermelhos do que grãos de vermelho, mais do que tâmaras maduras. Os seus dois seios estão bem plantados no seu peito.

m outro cântico de amor é a jovem virgem que expressa o seu desejo:


Oh, tu, o mais belo dos homens!
Meu desejo é velar por teus bens
Como dona da casa,
Que teu braço cubra o meu braço
E meu amor te cumule.
Eu confio ao meu coração
Um desejo de amante:
Que eu possa tê-lo esta noite por esposo!
Sem ele sou apenas um ente na tumba,
Pois não és a saúde e a vida?


 

ciúme, naquela época como hoje, muitas vezes interferia na relação amorosa. Em tal casoum jovem ou uma jovem apaixonados e enciumados podiam apelar para a magia. Entre os antigos egípcios um dos fetiches eróticos era a cabeleira. Assim, o homem ou a mulher enciumados apelavam para uma receita mágica infalível para fazer cair os cabelos dos rivais:

olocar uma folha de lótus queimada no óleo e esfregar a cabeça daquele (ou daquela) que se detesta.

mbora isso fosse algo como amarrar o guizo no gato, aquele que tivesse caído na esparela podia safar-se besuntando o crânio com um unguento à base de escamas de tartaruga e de gordura de pata de hipopótamo.

lguns textos encontrados pelos arqueólogos levam a crer que no dia marcado para o casamento, no final da tarde, o pai da noiva a conduzia em comitiva à casa do futuro genro, acompanhada de presentes. Essa mudança da moça e do seu dote para a casa do rapaz formava o essencial da cerimônia. Devia ser um cortejo pitoresco, colorido e barulhento. Na casa do noivo acontecia uma grande festa com inúmeros convidados que também traziam seus presentes. Depois da festa começava a vida em comum do casal.

o caso de ser firmado um contrato de casamento entre as partes, o que podia ocorrer até sete anos após o início da coabitação, procurava-se garantir os direitos da mulher e dos herdeiros se eventualmente houvesse a separação do casal ou morte do cônjuge. Um desses contratos rezava:

u te tomei como mulher e te dei (segue-se a lista dos bens). Se eu te repudiar enquanto mulher, seja porque te odeio, seja porque quero outra mulher que não tu, dar-te-ei (lista de doações) e dar-te-ei também um terço do que for adquirido entre nós, a partir de hoje. Os filhos que me destes (portanto, o contrato foi celebrado algum tempo após a união) e que me darás são os herdeiros de tudo o que possuo ou possa adquirir. Teu filho primogênito é meu filho primogênito (aqui termina o texto, com a lista dos móveis e objetos trazidos pela mulher no momento do casamento, com a indicação, como sempre, de seu valor venal).

anto o homem quanto a mulher podiam pedir o divórcio, ato que não exigia qualquer formalidade nem a redação de qualquer documento. Bastava que um cônjuge repudiasse o outro oralmente. Adultério, incompatibilidade de gênios ou esterilidade eram algumas das causas que podiam acarretar a separação. O marido podia enviar à esposa um documento informando-a que renunciava ao seu direito à união conjugal e liberando-a para um novo casamento. Nos casos em que tal documento não existisse, a sabedoria popular aconselhava:

unca te cases com uma mulher cujo marido ainda está vivo, de medo que ele se torne teu inimigo. Isso seria perigoso e correrias o risco de te expores a acusações de adultério.

ncarado como um ideal social, o casamento não podia ser maculado pela infidelidade, uma falta tão grave que era apresentada aos noivos como um grande crime. Como advertência contava-se aos jovens a lenda do crocodilo, segundo a qual a mulher adúltera e seu amante teriam, por castigo, trágicos destinos. O adultério teoricamente era punido com severidade. As leis previam a emasculação para o homem violador, uma punição com cem bastonadas caso o crime tivesse sido praticado sem violência, a mutilação do nariz e das orelhas, ou ainda trabalhos forçados. A mulher podia ter o nariz cortado ou ser banida para a Núbia. Na prática as punições eram bem mais brandas, quando as havia. Afinal, a própria deusa Néftis, irmã e amante do deus Seth, lhe fora infiel com o deus Osíris... Mais do que para sanções físicas, os sábios apelavam para os conselhos do tipo não faças aos outros o que não queres que te façam. Um deles dizia:

ão copules com uma mulher casada. Aquele que copula com uma mulher casada, em seu leito, poderá, por sua vez, ter sua própria mulher violada no chão.

s pintores e os escultores – observa Pierre Montet – dão-nos uma imagem simpática da família egípcia. O pai e a mãe aparecem de mãos dadas ou abraçados pela cintura. Os filhos, muito pequenos, qualquer que seja a sua idade, agrupam-se em torno dos pais. No reinado de Akhenaton tornou-se moda representar as efusões do casal régio. A rainha aparece sentada nos joelhos do rei. O rei e a rainha devoram os filhos de beijos. E os fiIhos respondem, acariciando o queixo de seu pai ou de sua mãe com as suas pequeninas mãos. Nas pinturas sepulcrais, o marido e a mulher aparecem retratados sempre um junto do outro, unidos para toda a eternidade como nos apraz supor que tivessem sido durante a vida.