A PIRÂMIDE TORTA

 

Ao que tudo indica, o faraó Snefru foi um dos mais laboriosos constru-tores do antigo Egito. No planalto líbio, a dez quilômetros de Saqqara, mandou erguer, durante seu reinado de 24 anos, duas enormes pirâmides e deu-lhes nomes apropriados: Pirâ-mide Refulgente do Sul e Pirâmide Refulgente.

Elas estão lá até hoje. A primeira é conhecida atualmente como pirâmi-de torta e a segunda como pirâmide vermelha. Em conjunto elas têm mais pedras do que a pirâmide de Kéops. Sabe-se, também, que Snefru construiu templos por todo o Egito e parece ter sido o responsável pela edificação dos primeiros templos do vale e suas calçadas, bem como das primeiras pirâmides menores, subsidiárias, postadas junto das estruturas principais e que, posteriormente, se tornaram rotineiras.

Os arqueólogos têm sugerido que a pirâmide torta teria sido concluída às pressas, o que teria exigido uma redução na sua altura e explicaria seu formato, o que é corroborado pelo fato das pedras da parte superior da obra terem sido assentadas com muito menos cuidado do que as da parte inferior. Também pode ter ocorrido que o ângulo de inclinação da pirâmide tenha sido reduzido pelo arquiteto para tentar diminuir o volume imenso de esforço sobre as paredes das câmaras internas que, acredita-se, poderiam estar apresentando rachaduras durante a construção. Cada face da pirâmide mede, aproximadamente, 189 metros em sua base e sua altura deve ter sido de 102 metros, correspondente a um prédio de 34 andares. Entre todas as pirâmides ainda existentes, essa é a que está externamente melhor conservada, pois nenhuma outra preserva tanto do revesti-mento feito com a pedra calcária da localidade de Tura. Um visivel aperfeiçoamento no método de aplicação do revestimeto e de colocação dos blocos deve ser a causa dessa maior durabilidade.

Inédita também se apresenta essa pirâmide pelo fato de possuir duas entradas: uma em sua face norte e outra na face oeste. Mais ou menos no centro da face norte e a uma altura de cerca de 12 metros do solo, uma abertura dá acesso a um corredor descendente (1), estreito e de teto baixo, que penetra inicialmente na pirâmide e depois no solo rochoso. A uma distância de aproximadamente 73 metros e 60 centímetros da entrada torna-se plano por cerca de 80 centímetros e, nesse ponto, sua altura sobe para 12 metros e 65 centímetros, formando um vestíbulo estreito e majestoso com mais ou menos cinco metros de comprimento (2). Imediatamente após surge a primeira câmara mortuária (3) que mede seis metros e 24 centímetros por 11 metros e 27 centímetros e tem altura de cerca de 17 metros. Seu piso foi elevado, por meio de blocos de pedra, a uma altura de seis metros e 24 centímetros acima do piso do vestíbulo. O mais interessante nessa câmara é seu teto em ponta. Ele foi formado deslocando-se apenas uns poucos centímetros para dentro cada uma das 15 carreiras superiores de calcário nas quatro paredes, o que deixou no topo um pequeno espaço que mede somente um metro e 60 centímetros por 30 centímetros. Na parede que fica do lado oposto à entrada da câmara, há uma passagem com três metros de comprimento que leva a uma cova profunda que foi encontrada cheia de blocos de pedra e pavimentada. Acima dela ergue-se perpendicularmente uma espécie de poço até uma altura de quase 13 metros (4). Uma segunda passagem parte do teto da câmara em aclive e atinge a parede do poço. Dois blocos de pedra foram encontrados abrigados em recessos existentes dentro do poço: um no lado norte, imediatamente abaixo da abertura da passagem superior e o outro no lado sul, próximo ao topo do poço, provavelmente destinado a tapá-lo. Os blocos, entretanto, não foram possicionados nas aberturas.

Por sua vez, da face oeste da pirâmide parte um segundo corredor (5) que conduz a uma segunda câmara funerária (6). Ele penetra em declive no monumento, faz um percurso de 64 metros até atingir o nível do solo e dai prossegue horizontalmente por mais 20 metros. Nesse ponto ergue-se a segunda câmara funerária que, a exemplo da primeira, também tem o teto em ponta e o piso elevado a uma altura de quatro metros e 26 centímetros por meio de camadas de pequenos blocos de pedra. Os arqueólogos encontraram esse segundo corredor parcialmente bloqueado com pedras e mesmo sua entrada estava recoberta pela camada de cobertura da pirâmide. O único meio de atingir a câmara superior, depois que a pirâmide ficou pronta, era através de uma passagem talhada toscamente a partir de uma abertura no lado sul do teto da câmara inferior e que atingia um ponto na seção horizontal do corredor superior (7). Nesse corredor havia duas portas corrediças (8) que isolavam completamente o trecho onde desembocava a passagem de ligação. Apenas a porta mais afastada da câmara funerária foi encontrada fechada.

Dentro dessa pirâmide os arqueólogos encontraram apenas alguma cordoalha e cestos de datação incerta, bem como os restos desmembrados de uma coruja e parte dos esqueletos de cinco morcegos, reunidos e colocados dentro de uma caixa de madeira posta em uma cavidade do piso de um dos corredores. Nenhum vestígio de sarcófago foi achado em qualquer das câmaras. O nome do faraó Snefru foi encontrado escrito com ocre vermelho em duas das pedras do monumento, uma delas localizada abaixo do piso da câmara funerária superior.

Uma segunda pirâmide (9), bem menor, foi construída a uma distância de 55 metros ao sul da pirâmide torta. Cada um dos seus lados mede cerca de 55 metros na base e sua altura alcançou 32 metros e 54 centímetros. Internamente possui um corredor descendente, que parte de uma entrada localizada acima do solo no centro de sua face norte, uma curta passagem horizontal e uma passagem ascendente que abre para uma câmara mortuária (10) medindo pouco mais de dois metros quadrados. Frente à entrada do monumento há um pequeno santuário (11) com uma cavidade no centro do piso e na face leste da pirâmide erguiam-se duas estelas de pedra calcária com quatro metros e 87 centímetros de altura e o topo arredondado, as quais ladeavam um pequeno altar de pedra (12). Uma das estelas não chegou até nossos dias, mas a outra apresenta um baixo relevo com a figura sentada do rei Snefru usando a coroa dupla, um vestuário curto de linho e segurando um mangual na mão direita. Um falcão de Hórus e os nomes e títulos do faraó completam a estela. Essa pirâmide subsidiária provavelmente foi construída para sepultar as vísceras do faraó, as quais eram retiradas do corpo durante o processo de mumificação e guardadas nos vasos canopos. Entretanto, nada foi encontrado em seu interior.

O complexo funerário da pirâmide torta não apresentava um templo mortuário propriamente dito. Havia apenas um recinto aberto para oferendas (13), com um altar (14) e duas estelas de pedra calcária (15). As estelas tinham quase o dobro da altura daquela encontrada junto à pirâmide menor, eram do mesmo formato e estavam decoradas com os nomes e títulos do rei. O altar, coberto por lajes apoiadas sobre duas paredes laterais de pedra, era formado por três blocos calcários e uma mesa de oferendas de alabastro, a qual se inseria em uma cavidade talhada na superfície superior dos blocos, própria para recebê-la. O recinto era cercado por muros de proteção feitos também de pedra.

Uma calçada (16) com cerca de três metros de largura e 705 metros de comprimento e sem cobertura partia do muro que rodeava a pirâmide torta na sua face norte e levava até o templo situado no vale. Ladeando a calçada havia paredes de blocos de pedra com espessura de um metro e 98 centímetros na base e altura de um metro e 87 centímetros. Junto ao muro que rodeava a pirâmide a calçada formava dois recessos (17) e em um deles havia uma porta, a qual permitia que os sacerdotes adentrassem o recinto da pirâmide sem necessidade de se deslocarem até o templo do vale e de lá retornarem pela calçada.

O chamado templo do vale, ao ser descoberto, supreendeu os arqueólogos pela excelência da sua decoração e por sua monumentalidade, que contrastava com a simplicidade do templo mortuário. De planta retangular, era todo rodeado por um muro de proteção e totalmente construído com pedra e revestido com o calcário de Tura. Frente à entrada, situada no centro da face sul, havia um pátio estreito (18), cuja parede mais externa era formada pela continuação de uma das paredes da calçada que ligava a pirâmide ao templo do vale. No lado externo dessa parede havia duas estelas de calcário (19) decoradas com os nomes e títulos do rei, semelhantes em forma e tamanho àquelas existentes junto à pirâmide subsidiária. O edifício em si ocupava uma área de 1206 m² (46 metros e 60 centímetros de comprimento por 25 metros e 90 centímetros de largura) e estava dividido em três partes: um vestíbulo de entrada (20) flanqueado de ambos os lados por duas câmaras, um pátio aberto (21) e seis santuários (22) ao fundo de um pórtico com pilares (23). Cenas em alto-relevo decoravam as paredes do vestíbulo de entrada, os pilares monolíticos e retangulares, as paredes laterais do pórtico e pelo menos dois dos santuários. Alguns representavam procissões de mulheres portadoras de oferendas trazendo produtos variados para o templo e outros mostravam o faraó realizando várias cerimônias rituais na presença dos deuses. Estátuas do rei, maiores que o tamanho natural, acomodavam-se em nichos das paredes do fundo de alguns dos santuários. Presas à parede, pareciam mais enormes altos-relevos do que estátuas propriamente ditas.

 

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